Turismo no seringal

Pousada gera atividade turística comunitária em área onde viveu Chico Mendes

Pousada Seringal Cachoeira em Xapuri (AC) Foto: Fabiana Chaves

Pousada Seringal Cachoeira em Xapuri (AC)
(Foto Fabiana Chaves)

O turismo pode se transformar numa das principais alternativas de atividade econômica para as comunidades da Amazônia. Segundo a Organização Mundial de Turismo (OMT), os roteiros de turismo ecológico e cultural estão entre os que mais crescem no mundo, transformando pequenas localidades em receptoras de grande número de visitantes.

A Pousada Seringal Cachoeira, na área rural do município de Xapuri (AC), promove várias ações ligadas ao turismo ecológico. As atividades geram renda e preservam a identidade sociocultural da comunidade. Trata-se do local em que nasceu e viveu Chico Mendes. Grande parte de sua família ainda mora ali.

O Cachoeira foi território de disputa por terra nas décadas de 1970 e 1980. No local, ocorreram os primeiros “empates”, ato político em que os seringueiros e suas famílias se colocavam na frente de tratores e caminhões para evitar o desmatamento. Assim, procuravam garantir a conservação do ambiente como forma de manter seu sustento. A floresta de pé gera renda para várias famílias de extrativistas. A floresta derrubada, transformada em pasto, gera desemprego para muita gente e renda apenas para o pecuarista.

Em 1989, a área se transformou no Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes (PAE Chico Mendes), administrado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O Cachoeira é um dos seringais que integram o PAE.

Considerado líder de um movimento de resistência pacífica, Chico foi assassinado em dezembro de 1988. A partir daí seu nome ganhou cada vez mais notoriedade. Xapuri começou a receber visitantes de todas as partes do mundo. As pessoas queriam conhecer a história do seringueiro que se envolveu, lutou e perdeu a vida defendendo uma causa maior. Xapuri atrai cada vez mais turistas: jornalistas, pesquisadores, ativistas ambientais ou pessoas querendo conhecer as belezas da Amazônia. Dessa maneira, a pequena comunidade do Seringal Cachoeira foi se tornando, aos poucos, um destino turístico.

O turismo na floresta

Quando os primeiros grupos de turistas começaram a aparecer no seringal, a comunidade não dispunha de infraestrutura para hospedagem e alimentação; os moradores acabavam por receber os visitantes em suas casas. “As pessoas se adequavam ao que a gente podia oferecer. Até hoje eu recebo um monte de gente na minha casa”, conta o líder comunitário e guia turístico Nilson Mendes.

Nilson: turismo gera educação ambiental Foto: Fabiana Chaves

Nilson: turismo gera educação ambiental
(Foto Fabiana Chaves)

Por perceber que a demanda turística crescia, a Associação de Moradores e Produtores do PAE Chico Mendes decidiu criar um redário para receber os turistas. O redário consistia em um galpão com várias redes atadas. “Mas com o tempo, o redário também se tornou insuficiente e os visitantes reclamavam da falta de conforto. Depois de passar o dia todo andando, explorando a região, não conseguiam dormir direito”, afirma Nilson.

A ideia de construir uma pousada no seringal surgiu em uma das reuniões da associação de moradores. Fruto de parceria da comunidade com os governos federal e estadual, por meio do INCRA, a pousada Seringal Cachoeira foi inaugurada em 2008 dentro do PAE Chico Mendes, a 33 km da sede do município de Xapuri. É um empreendimento comunitário gerenciado pela associação.

A construção começou em 2006, com um investimento de R$ 400 mil e mão de obra local. “Tudo foi resolvido aos poucos dentro das reuniões do sindicato [associação]. As pessoas selecionadas para trabalhar na pousada receberam treinamento em hotelaria e turismo e aprenderam um pouco sobre sistemas de gestão. Tudo por conta das parcerias”, conta a presidente da associação de moradores, Nazaré Vieira Mendes.

A pousada funciona como uma cooperativa, bem como o desenvolvimento das várias atividades ligadas ao turismo, como o arborismo, a realização de trilhas e passeios ciclísticos. A administração do empreendimento é de responsabilidade de Fernanda Mendes, recém-formada em turismo. “Posso dizer que sou realizada profissionalmente. Aqui eu trabalho na minha área e tenho a oportunidade de ajudar toda a comunidade”, diz.

Fernanda é funcionária da secretaria de turismo estadual, que paga seu salário. A renda dos outros funcionários provém da própria pousada. Além disso, dez por cento do lucro total é investido na infraestrutura geral da comunidade. “Desse jeito todos se envolvem no bom andamento dos serviços turísticos”, relata a administradora. Durante a seca (junho a setembro), a pousada recebe mais visitantes. Fernanda afirma que os turistas preferem essa época para aproveitar melhor as opções de lazer.

Muita gente se beneficia com as novas demandas do turismo. Além dos benefícios diretos, são gerados benefícios indiretos. Uma parte da população trabalha na própria pousada, com salário fixo, desenvolvendo serviços ligados à hospedagem, manutenção, recepção e alimentação. Outros produzem e vendem alimentos para o restaurante da pousada, prestam serviços de guia turístico ou trabalham no circuito de arborismo.

Antes de trabalhar na pousada, Sebastiana da Silva cuidava dos filhos e ajudava seu marido no roçado. Hoje, trabalha como cozinheira: “essa oportunidade foi muito boa, pois posso ajudar no orçamento familiar, comprar alguma coisa que os filhos pedem e que antes o dinheiro não dava. Melhorou toda comunidade por conta de todo mundo ter mais renda, de um jeito ou de outro. As pessoas não precisam mais sair daqui pra trabalhar. E como não é todo dia que tem movimento aqui no restaurante, dá até pra continuar fazendo outros trabalhos, como roçado, coleta de castanha”, explica.

Conhecendo a pousada

Construída às margens de um lago, com decoração rústica e clima aconchegante, a pousada conta com 32 leitos, divididos em 3 chalés e 2 quartos coletivos, chamados de “belichários”. Dois chalés são para casal e o terceiro chalé tem acomodação para família de até 4 pessoas. Os belichários são divididos por gênero e cada um possui acomodação para 12 pessoas.

Na pousada, o turista pode conhecer um pouco mais sobre a história do Seringal Cachoeira; contratar um guia para realizar trilhas na floresta; alugar uma bicicleta e fazer um passeio ciclístico pela região; participar do circuito de aventura, com rapel, arborismo e tirolesa; saborear um tambaqui assado ou um filé ao molho de castanha, acompanhados por sucos de frutas da Amazônia, como cupuaçu, graviola, acerola, caju e cajá.

Restaurante serve pratos típicos da culinária amazônica Foto: Glauco Capper

Restaurante: pratos da culinária amazônica
(Foto Glauco Capper)

Todo o serviço prima pelo respeito ao ambiente e a conscientização ecológica. “O turismo ideal é aquele que gera educação ambiental, por isso fico muito feliz quando universitários e pesquisadores vêm conhecer a região”, conta Nilson Mendes.

Segundo Fernanda, a pousada tem recebido grupos grandes que, na maioria das vezes, lotam as instalações. Por outro lado, também há bastante interesse de casais devido ao clima aconchegante e tranquilo. “Já existe um projeto de ampliação. Acredito que quanto mais pessoas conhecerem a região, maior será a conscientização sobre a necessidade da preservação da floresta. Ela não é só bonitinha, é fonte de trabalho e renda”, afirma.

Para visitar a pousada o ideal é ligar com antecedência, reservar um chalé ou vaga no belichário e agendar os serviços de lazer que deseja contratar. A pousada conta também com serviço day use, no qual o turista usufrui de toda a infraestrutura durante o dia, mas sem precisar pagar por um chalé. O telefone de contato é (68) 9956-0780.

Texto final: Fabiana Chaves

Edição: Fabiana Chaves e Maurício Bittencourt

Reportagem: Eva Ferreira e Cínthia Michelli

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